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Espaços que Transformam: Uma Perspectiva Sistémica sobre o Desenvolvimento Humano

O desenvolvimento humano é, por natureza, um processo dinâmico, contínuo e profundamente interdependente. A célebre ideia de que "o espaço vai se transformando, as pessoas vão se transformando" reflete essa reciprocidade entre sujeito e ambiente, espelhada na teoria bioecológica de Urie Bronfenbrenner (1979). Nesta perspectiva, o ser humano não se molda apenas pelo seu meio — sistemas familiares, escolares, culturais e sociais — como também o molda, de modo atuante e com intencionalidade. Esta interação constante, evidencia que mudanças no ambiente podem desencadear transformações significativas no desenvolvimento individual, e vice-versa.

Nesta ordem de ideias, os espaços de expressão artística e partilha comunitária adquirem um valor singular. Iniciativas como o espaço ECOA— um espaço criativo de oficinas abertas à diversidade de distintos percursos de vida— não são apenas locais físicos de aprendizagem técnica. Transformam-se em ecossistemas de desenvolvimento, no qual os participantes exploram capacidades, descobrem interesses, constroem relações significativas e reconfiguram o seu sentido de pertença. Estes contextos, mais do que "oficinas criativas", são agentes transformadores de mudança— de pessoas, de comunidades, de conceções do mundo.

A teoria do desenvolvimento ao longo do ciclo vital, proposta por Paul Baltes (1987; Baltes, Lindenberger & Staudinger, 1998), aprofunda esta compreensão ao salientar que o desenvolvimento é um processo vitalício, multidimensional e contextualizado. Segundo Baltes, cada fase da vida encerra potenciais de crescimento e declínio, como também de adaptação. Neste sentido, um jovem desempregado encontra, numa oficina de carpintaria, a motivação para empreender; ou por exemplo uma mulher em idade avançada redescobre competências artísticas que pareciam esquecidas. O espaço físico, social e afetivo do projeto torna-se então palco de expressão da flexibilidade do ser humano — isto é, da sua capacidade de mudança, mesmo quando é confrontado com certos limites e adversidades (Papalia et al, 2009).

Esta perspectiva de desenvolvimento é partilhada também pelo Relatório de Desenvolvimento Humano 2023/2024, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), que defende uma orientação para o futuro baseada na cooperação, na esperança e na resolução criativa dos desafios globais. O relatório sublinha que "a adaptação destes princípios a diferentes contextos colocar-nos-á na via do diálogo e da ação produtivos, que devem ser flexíveis e iterativos no meio de tanta incerteza" (PNUD, 2024, p. 8). Esta adaptação é precisamente o que se verifica em iniciativas comunitárias que valorizam a criatividade, a inclusão e a construção coletiva do bem comum.

O projeto em análise articula-se ainda com diversos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que reforçam a interdependência entre desenvolvimento individual e coletivo. O ODS 4 - Educação de Qualidade, manifesta-se na promoção da aprendizagem ao longo da vida, com metodologias inclusivas e centradas no potencial de cada participante. Já o ODS 8 - Trabalho Digno e Crescimento Económico, torna-se visível quando participantes descobrem aptidões artísticas com potencial no seu empoderamento e autonomia financeira, seja na criação de produtos, realização de workshops ou reintegração no mercado de trabalho. O projeto também respondeu ao ODS 10 - Redução das Desigualdades, ao garantir acessibilidade, diversidade e respeito por distintos percursos de vida, e ao ODS 11 - Cidades e Comunidades Sustentáveis, ao promover o sentimento de pertença e a participação ativa em iniciativas comunitárias. Por fim, o ODS 12 - Consumo e Produção Sustentáveis, ganhou expressão na reutilização criativa de materiais, numa lógica de economia circular e responsabilidade ecológica.


Assim, podemos afirmar que este espaço de criação artística é, simultaneamente, um espaço de criação de desenvolvimento humano. Reforçando-se que, ao transformar os espaços, criamos as condições para que as pessoas se transformem — e ao transformar as pessoas, reinventamos os espaços. Esta reciprocidade, como salientam Bronfenbrenner e Baltes, é a chave para compreender o verdadeiro impacto das intervenções comunitárias sustentáveis: não apenas respondem a necessidades locais, como igualmente catalisam processos de mudança individual e social.

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